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O brasileiro sofre e não foge à luta: A epidemia da ansiedade que nos une

  • Foto do escritor: Gabriela freire freitas
    Gabriela freire freitas
  • 16 de abr.
  • 6 min de leitura

No país do carnaval e da alegria, milhões lutam contra um inimigo: a ansiedade. Uma jornada de dor, resistência e esperança por uma saúde mental melhor


Imagem retirada do site: Freepik
Imagem retirada do site: Freepik

Acordar com o coração disparado, sem motivo aparente. Sentir um nó constante na garganta, uma angústia que parece nunca passar. Perder o sono, imerso em pensamentos repetitivos, sempre voltados para o "e se?", "e quando?", "e agora?". Este é o retrato de uma nação que, por trás de sua fama de povo caloroso e sorriso fácil, vive em constante estado de alerta.


Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país com a maior prevalência de transtornos de ansiedade no mundo. São 18,6 milhões de brasileiros, o que representa 9,3% da população, enfrentando essa batalha invisível todos os dias.


De acordo com a psicóloga Mônica Alves, "uma das grandes causas que contribuem para esse cenário está relacionada ao estresse, principalmente o estresse ligado ao trabalho, à pressão por produtividade e às exigências do sistema. Além disso, fatores como a falta de recursos financeiros e um contexto social e cultural que ainda desconhece ou minimiza os sintomas da ansiedade acabam agravando o quadro". Ela ainda destaca que "traumas vividos na infância muitas vezes são desencadeadores da ansiedade na vida adulta. Vivemos uma era de excesso de informação, competitividade e respostas imediatas, e as pessoas estão cada vez menos tolerantes à espera. Isso tudo contribui para o desenvolvimento de doenças psicossomáticas".


A resposta envolve uma complexa teia de fatores sociais, econômicos e culturais. O Brasil vive tempos de pressões insuportáveis, e o brasileiro, com sua resiliência inata, parece estar constantemente no limite. Há o estresse econômico, com desemprego em níveis elevados e a dificuldade de sustentar famílias em meio a uma economia instável. Somam-se a isso o medo incessante da violência urbana, que transforma o ato de sair de casa em um teste de coragem. E ainda há a cultura da produtividade desenfreada, que coloca sobre as costas de muitos a expectativa de "dar conta de tudo" – uma demanda impossível que sufoca e esgota.


Uanne Mayane, psicóloga especialista em Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), destaca que "existem fatores genéticos e de personalidade, herdados, que contribuem para o surgimento dos Transtornos Mentais, incluindo a ansiedade. Mas o ambiente em que a pessoa vive também tem grande impacto". Ela explica que o uso abusivo de substâncias, estresse recorrente e desigualdade socioeconômica são agravantes comuns no Brasil, o que torna o país mais vulnerável a esses transtornos. Mônica Alves complementa esse raciocínio ao afirmar que "quando olhamos para a população que vive com poucos recursos financeiros, vemos o surgimento de sintomas como medo, insônia, preocupação excessiva e incerteza quanto ao futuro, o que pode evoluir para depressão e até ideias suicidas".


Dados recentes da OMS mostram que o Brasil tem o maior índice global de ansiedade: 9,3% da população enfrenta essa condição. Este índice é superior ao de países como Paraguai (7,6%), Noruega (7,4%) e Austrália (7%). A pandemia de Covid-19, que abalou o mundo, agravou ainda mais essa situação. O isolamento, o medo da contaminação e as perdas de entes queridos fizeram com que a prevalência de ansiedade e depressão aumentasse 25% em apenas um ano. Além disso, os altos índices de desemprego e a constante instabilidade econômica são combustível para a ansiedade, ao lado da violência, que causa medo constante e um estado de alerta permanente.


"Chegaram a dizer que o Brasil vive uma segunda pandemia, desta vez relacionada à saúde mental", comenta Mônica. "A falta de socialização, o medo de se infectar, o desemprego e a instabilidade no trabalho aumentaram o nível de estresse e sofrimento psíquico da população".


Outro fator que contribui é o uso excessivo de redes sociais, que amplifica as pressões e expectativas, especialmente entre os jovens. Um estudo recente mostrou que 26,8% dos brasileiros já receberam diagnóstico médico de ansiedade, sendo que entre jovens de 18 a 24 anos esse número sobe para alarmantes 31,6%.


Os sintomas são muitos: preocupação excessiva, irritabilidade, dificuldade de concentração, fadiga e insônia. O corpo e a mente se desgastam. Palpitações, sudorese, tensão muscular e até náuseas fazem parte do quadro. Mônica Alves reforça: "taquicardia, sudorese, vômitos, dores de cabeça, insônia, tensão muscular, aceleração no peito, diarreia — são alguns dos sinais mais comuns que observamos nos atendimentos".


Mas o mais doloroso de tudo? Muitas dessas pessoas não conseguem pedir ajuda. Não porque não queiram, mas porque, em uma sociedade que glorifica a força e a invulnerabilidade, admitir que você está sobrecarregado é visto como fraqueza. Muitos enfrentam o preconceito, o julgamento, e temem ser tratados como menos capazes por precisarem de tratamento ou medicação. "O preconceito ainda é muito latente. Muitos acreditam que vai passar, que vão conseguir lidar sozinhos, sem ajuda profissional. Mas isso pode agravar o quadro e atrasar o tratamento", alerta Mônica.


Uma jovem de 23 anos, que preferiu não se identificar, compartilhou sua experiência com a ansiedade generalizada. "Estar ansiosa é como estar em um mar sem saber nadar. Às vezes você acha que está perto da costa, mas, de repente, uma onda te puxa de volta, te afogando e te tirando todas as forças de lutar. Cada dia é uma batalha contra os pensamentos sobre o futuro, sobre o que minha chefe vai reclamar hoje, ou se o dinheiro vai durar até o próximo salário". Suas palavras ecoam o sentimento de muitos: viver em constante estado de preocupação com o amanhã e nunca conseguir se libertar do peso do futuro.


Segundo o psicólogo Gabriel Jesus, o estresse relacionado à insegurança financeira e à violência urbana são fatores que pesam muito na saúde mental dos brasileiros. "A preocupação com fonte de renda e segurança financeira impacta diretamente a percepção de autossuficiência. Além disso, há o medo da violência, que muitas vezes mantém as pessoas em constante estado de alerta, afetando gravemente o bem-estar", destaca.


A estudante de psiquiatria Julia Ferreira também traz à tona a questão da estrutura de saúde pública no Brasil. "Há, no Brasil, como serviço do Sistema Único de Saúde (SUS), serviços voltados à saúde mental e cuidados de transtornos de diversos graus e tipos. Os atendimentos e tratamentos são feitos, prioritariamente, na Atenção Básica, principal porta de entrada para o SUS, ou nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), onde o usuário recebe atendimento próximo da família com assistência multiprofissional e cuidado terapêutico conforme o quadro de saúde. Ainda assim, há pouca visibilidade e política pública em apoio a esses serviços, o que leva à desvalorização de profissionais, maior tempo de espera para pacientes que precisam de tais serviços e a precarização dos mesmos de forma geral. É necessária maior atenção a esses setores, valorização dos serviços e um esforço para despertar o interesse e a conscientização da população sobre cuidados tão essenciais quanto qualquer outro".


Mônica reforça essa necessidade: "precisamos de mais profissionais dentro do Sistema de Saúde, com valorização profissional, com salários dignos e com boas condições de trabalho".


Ainda assim, nem tudo está perdido. Existem caminhos para a saída desse labirinto. Terapias, como a cognitivo comportamental, que ajudam a mudar padrões de pensamento negativos; a meditação, a ioga, e o exercício físico, que trazem alívio para os sintomas. "A psicoterapia, focada em reconhecer pensamentos irrealistas e aprender estratégias para lidar com as preocupações, é essencial", complementa Gabriel. Mônica acrescenta: "através da compreensão das causas, como traumas e experiências vividas, é possível tratar de forma mais eficaz a ansiedade. Em muitos casos, o uso de medicamentos atua nos sintomas, enquanto a terapia atua na origem. São caminhos que se complementam, e não devem ser vistos como excludentes".


É necessário falar sobre a ansiedade. É urgente acolher, sem julgamentos, aqueles que sofrem com essa condição. A saúde mental não é um privilégio – é um direito fundamental. Enquanto milhões de brasileiros lutam diariamente contra esse inimigo invisível, cada pessoa pode ser um ponto de apoio, um ombro amigo. Chegou o momento de derrubar os tabus e tratar a ansiedade e a depressão como o que realmente são: doenças que exigem tratamento e respeito, não um fardo de estigma a ser carregado.

Quando se olha para o outro com empatia, percebe-se que muitas das maiores batalhas não são visíveis. O Brasil, o país mais ansioso do mundo, está em busca de uma saída, de um respiro, de um instante de tranquilidade. É hora de ouvir seu grito.




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